Dependência química: tipos, sintomas e melhores tratamentos.
Vamos conversar sobre dependência química?
Esse é um assunto cercado de mitos, preconceito e
desinformação, além de, muitas vezes, não ser levado a sério como deveria.
Só para se ter uma ideia do quanto o tema é
complexo, no mundo, 35 milhões de pessoas sofrem com algum tipo de transtorno
causado pelo uso de drogas.
Mas o dado ainda mais alarmante é que apenas um em
cada sete adictos realiza tratamento.
O levantamento completo pode ser acessado no Relatório Mundial sobre Drogas e Crimes 2019 e nos leva a uma
série de reflexões que procuro trazer neste texto.
Minha ideia é que, por meio deste conteúdo,
possamos abordar a dependência química com toda a seriedade e complexidade que
ela merece.
Aproveite para tirar suas dúvidas e também deixar
para trás alguns pensamentos ultrapassados que, eventualmente, ainda façam
parte do seu imaginário.
E se você se pergunta como pode ajudar um dependente químico, também terá essa
resposta a partir de agora.
Siga acompanhando!
O que é
dependência química?
Dependência química é um problema crônico, que se
caracteriza pela mudança no comportamento do indivíduo ao administrar
determinada substância. Como consequência, ele passa a se ver dominado por
impulsos, cada vez mais recorrentes, para voltar a fazer uso da droga.
Adotando uma linguagem mais técnica, o quadro nada
mais é do que um padrão mal adaptado do consumo de substâncias, gerando
significativos prejuízos clínicos e de ordem emocional.
Nesse caso, os entorpecentes passam a ser um
refúgio do adicto na busca por sensações de bem-estar e, consequentemente,
alívio de sentimentos ruins, como ansiedade e medo.
Dependência
química é doença?
Sim, a dependência química é uma doença de característica
crônica.
Diversos fatores ajudam a definir esse quadro como
uma patologia, mas destaco dois principais: tolerância e abstinência.
· Tolerância:
necessidade de ingerir doses cada vez maiores para que a droga desperte os
efeitos desejados em contato com o organismo, que já se mostra adaptado às
quantidades habituais.
· Abstinência:
manifestação de sintomas fisiológicos e cognitivos desconfortáveis resultantes
da interrupção da administração da droga.
O que leva o
usuário à dependência química?
A dependência química, no meu
entendimento, precisa ser vista como uma doença biopsicossocial.
Ou seja, são os aspectos biológicos, psicológicos e
sociais que levam um indivíduo a esse tipo de quadro.
Os seres humanos, naturalmente, procuram situações
que lhes proporcionem prazer e aceitação social.
Dessa forma, qualquer atitude que revisite essas sensações
tem uma forte tendência de ser repetida.
Na psicologia e na psiquiatria, chamamos tal
movimento de recompensa, e esse é um dos motivos que ajudam a explicar a
dependência.
Os indivíduos vão atrás de sentimentos positivos,
ainda que fugazes, sem medir as consequências do perigo ao qual estão se
submetendo.
Quais são os
principais fatores de risco?
Os fatores de risco da dependência química podem ser divididos
em três grandes grupos: biológicos, psicológicos e sociais.
Biológicos
Quando você consome uma substância, o sistema
nervoso central é afetado diretamente.
Afinal, ele é o principal responsável pela
liberação da dopamina, neurotransmissor que gera as nossas sensações de prazer
e que é estimulado no uso da droga.
Esse processo também ocorre de maneira natural.
Ou seja, produzimos o hormônio do bem-estar quando
realizamos atividades que nos completam.
No entanto, ao fazer uso recorrente de
entorpecentes, é como se enviássemos uma mensagem para o nosso cérebro dizendo
que o único modo de termos acessa a sentimentos positivos é por meio das
drogas.
Isso compromete o chamado sistema cerebral de
recompensas, que passará a não produzir mais os neurotransmissores de forma
natural.
Além disso, há um prejuízo funcional do lóbulo
frontal, responsável pela mediação de comportamentos e vontades.
Em outras palavras, o indivíduo passa a ser
impulsivo, desejando mais e mais a substância em questão, a fim de revisitar
sensações de prazer.
Acontece que, agora, a produção de dopamina está
comprometida e, para sentir bem-estar, é necessário consumir doses cada vez
mais elevadas e, ainda sim, a duração do feito será menor.
Psicológicos
A falsa noção de que a droga é a razão para o
bem-estar acaba fazendo com que os indivíduos, de maneira equivocada, façam uso
de substâncias nocivas para aliviar preocupações emocionais.
Administrados como muletas, os psicoativos
representam uma fuga da realidade.
Sendo assim, sempre que o adicto se deparar com uma
situação desconfortável, vai recorrer a esse artifício.
A dependência química, nesse caso, vai se
instalando de forma progressiva como um antídoto psicológico contra o medo, as
frustrações e a ansiedade, por exemplo.
Sociais
Por último, mas não menos importante, temos o
aspecto social.
Hoje em dia, mesmo que a legislação promova graves
sanções a quem incentiva o consumo ou venda de substâncias lícitas e álcool
para menores de idade, por exemplo, o acesso a eles ainda é muito fácil.
Inclusive, até as drogas ilícitas são acessíveis.
É só observar uma festa rave para atestar isso – a
administração de substâncias sintéticas é quase um “kit
balada” obrigatório.
Somadas a esses fatores, temos a carência de um
suporte social adequado, a falta de políticas públicas em ações educacionais e
preventivas, a necessidade de aceitação em determinados grupos, a sensação de
libertação, contravenção e a fuga das responsabilidades.
Quais são os tipos
de dependência química?
Os tipos de dependência química são classificados
conforme a droga administrada.
Elas podem ser medicamentos (como ansiolíticos e
anticolinérgicos), repositores hormonais (como os esteroides e anabolizantes),
substâncias lícitas (como tabaco e álcool) e ilícitas de natureza estimulante (cocaína, crack e anfetaminas), opioide (heroína) e
alucinógena (como MD, LSD e ecstasy).
Cada tipo de dependência tem os seus sintomas,
características e especificidades.
Quais são os
sintomas de um dependente químico?
Os sintomas apresentados por um dependente químico
durante uma crise de abstinência variam conforme
uma série de aspectos.
Eles incluem tipo de substância ingerida, dosagem,
tolerância do organismo, via de administração e mistura de drogas diferentes,
entre outros.
Ainda assim, listei algumas das ocorrências mais
comuns, independentemente da modalidade do entorpecente consumido:
·
Descuido com a aparência e com cuidados pessoais e
higiênicos básicos
·
Mudanças comportamentais severas, podendo variar de
atitudes mais agressivas e irritabilidade até momentos mais depressivos.
·
Isolamento social
·
Abandono da sua rotina pessoal e profissional e
total descaso com suas responsabilidades
·
Problemas financeiros
·
Manifestação fisiológica, como náusea, vômito,
insônia, falta de apetite, fadiga, entre outras (dependendo do tipo de droga
consumida).
Quais são as
doenças causadas pela dependência química?
Mais do que sintomas, a dependência química pode
servir como uma potencializadora de outras doenças graves.
Um exemplo é quando age como vetor do HIV e da
hepatite C no compartilhamento de seringas em drogas injetáveis.
Substâncias que são fumadas, como tabaco e maconha, podem desencadear problemas respiratórios graves,
tais quais enfisemas e neoplasias de boca, faringe, laringe e pulmões.
Outros problemas também estão relacionados direta e
indiretamente ao consumo frequente e abusivo de substâncias nocivas.
Nesse caso, posso citar: insuficiência renal e
hepática, cirrose, comprometimento cerebral (como os AVCs), transtornos
comportamentais (depressão, esquizofrenia, síndrome do pânico), complicações
no coração (endocardite infecciosa) e desnutrição.
Afinal,
dependência química tem cura?
Conforme falei, a dependência química é uma
condição sem cura.
No entanto, isso não significa dizer que ela não
seja perfeitamente tratável e que o indivíduo
não possa retomar a sua qualidade de vida com uma supervisão adequada.
Hoje em dia, existem diversas maneiras de tratar
essa doença séria, e é exatamente sobre isso que vou falar com mais detalhes a
partir de agora.
Como a dependência
química pode ser tratada?
Acredito e defendo que a dependência química deve
ser tratada com toda a seriedade que merece.
Por ser um problema multifatorial, que tem a
influência de diferentes aspectos, entendo que cada caso exige uma abordagem
específica, que respeite as individualidades dos pacientes.
Afinal, toda pessoa tem a sua própria trajetória,
que não deve ser desconsiderada na adoção do tratamento ideal.
Qual é o melhor
tratamento para a dependência química?
Dito isso, ainda confio que a internação seja o melhor caminho –
preferencialmente voluntária, mas se não for possível, os outros tipos também
devem ser considerados.
Eu sei o quanto esse assunto pode ser delicado e
entendo os receios que ele traz consigo.
Mas pensando nisso, nós, do Grupo APS, montamos uma
metodologia de tratamento que visa, justamente, oferecer todo o suporte que o
interno e seus familiares precisam e buscam.
Nossa abordagem se baseia em um tripé formado pelas
seguintes abordagens: Aconselhamento Biopsicossocial, Terapia Racional Emotiva (TRE) e Programa dos 12 Passos.
Conheça, a seguir, cada uma dessas etapas.
Aconselhamento
Biopsicossocial
Mais ao início do texto apontei os três principais
fatores de risco da dependência química, que são os aspectos biológicos,
psicológicos e sociais.
Essa é uma abordagem moderna, que desmistifica
aquela falsa ideia de que todo adicto usa drogas porque quer ou porque não tem
caráter.
No aconselhamento biopsicossocial, buscamos
entender a realidade de cada paciente, revisitar o seu passado e, de forma individualizada
e humana, compreender o seu quadro.
O objetivo é, além de encontrar a melhor maneira de
tratar o interno, despertar nele uma consciência sobre a sua doença.
Ao trabalhar conceitos como responsabilidade e
autopreservação, por exemplo, conseguimos que ele vislumbre sua impotência
perante o vício.
Terapia Racional
Emotiva (TRE)
A segunda etapa é um processo evolutivo da primeira
fase.
Com a TRE, depois de despertada a consciência sobre
a doença, a ideia é que o indivíduo consiga problematizar alguns comportamentos,
atitudes e crenças erradas limitantes que o vício fez com que ele
desenvolvesse.
O método tradicional já é implementado desde a
década de 1950 e tem sua eficácia científica comprovada.
O seu sucesso está baseado na relação de confiança
estabelecida entre paciente e equipe multidisciplinar, para que essa mudança de
mentalidade seja algo natural, e não forçado.
Assim, aos poucos, o interno vai se convencendo de
que é possível mudar e que muitos dos seus posicionamentos passados não só o
prejudicaram como também afetaram as pessoas ao seu redor.
Programa dos 12
Passos
Ainda que cada paciente tenha o seu próprio caminho
e histórico pessoal com o vício, ele não é o único nessa situação.
Muitas outras pessoas passaram e continuam passando
por esse mesmo problema.
O Programa dos 12 Passos é a última fase do nosso
tripé de tratamento e também um espaço para compartilhar experiências.
Adotado em grupos de apoio, como Alcoólicos Anônimos
(AA) e Narcóticos Anônimos (NA), o programa é sobre a luta contínua pela
sobriedade.
Consiste em reconhecer sua impotência perante o
vício, buscar abrigo da espiritualidade e reprogramar o seu sistema de crenças
e valores.
Perguntas
frequentes sobre dependência química
Mesmo depois de ver diversos aspectos da
dependência química, é possível que você tenha chegado até aqui com dúvidas.
Por isso, neste final, resolvi reunir cinco dos
questionamentos que mais escuto em relação do tema e respondê-los de forma
direta e didática.
Confira!
Quando o uso de
drogas vira doença?
O uso recreativo de drogas se transforma em
dependência química quando o indivíduo perde o controle sobre o seu consumo e
isso começa a trazer prejuízos fisiológicos, cognitivos e comportamentais.
Muitas vezes, mesmo ciente do seu vício, ele tenta
parar ou diminuir a administração da substância e não consegue.
Quanto tempo leva
para uma pessoa se tornar um dependente químico?
A resposta para essa pergunta depende de uma série
de fatores, como o tipo de droga usada, a faixa etária em que o consumo começou
predisposição genética e tolerância do organismo, entre outros.
No entanto, há estudos que mostram que drogas como
o crack e a heroína podem causar dependência já nos primeiros usos.
Como é feito o
diagnóstico de um dependente químico?
Segundo o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, livro de autoria
da Associação Americana de Psiquiatria, o diagnóstico da dependência química obedece
a uma diretriz clara.
Ele se dá quando o indivíduo apresenta quadros de
abstinência, elevado grau de tolerância à droga, incapacidade de interromper o
uso, entre quatro outros critérios, de forma simultânea, a qualquer momento no
período de um ano.
Quanto tempo dura
o tratamento de dependentes químicos?
A metodologia de tratamento aplicada aqui na APS prevê uma duração de (1) um ano.
Acreditamos que esse seja o tempo necessário para
que o interno retome não só a sobriedade, mas também reprograme sua vida a
partir de novos valores e responsabilidades.
A dependência
química pode deixar sequelas?
Sem dúvidas que sim.
A dependência química pode deixar diversas sequelas
de caráter fisiológico, cognitivo e comportamental.
Entre as mais comuns, está o comprometimento do
sistema de recompensas cerebral, prejudicando a produção de neurotransmissores
como a dopamina.
Por: Fabrício Selbmann & APS
Nenhum comentário:
Postar um comentário